por Luiz Henrique Ferreira e Gabriel Nunes, como parte da reportagem "Volta por Cima", para a Universidade Anhembi Morumbi
Aos 17 anos, Rogério Camargo foi vítima de um acidente de moto e teve a perna esquerda amputada. Hoje, ele tem 34 anos, trabalha em uma loja de automóveis, é casado, tem uma filha e um filho e ainda luta contra o preconceito, desde o acidente.
O que ninguém sabe quando vai à loja onde Rogério trabalha é que ele já disputou duas finais parapan-americanas de voleibol sentado e foi campeão uma vez.
Com a ajuda do esporte, Rogério se colocou de volta na sociedade, mas ainda tem que trabalhar para se sustentar. Diferentemente dos jogadores seleção da masculina eneacampeã mundial, que são bancados pelos clubes onde atuam, os paraatletas não recebem para jogar, treinam e jogam por prazer, mas gostariam de ter mais visibilidade, a ponto de viver pelo esporte.
Rogério joga pelo Cruz de Malta, pelo qual já foi tricampeão brasileiro, tetracampeão paulista e bicampeão do torneio Sérgio Del Grande – organizado pelo Comitê Paraolímpico Brasileiro. Para ele, “o vôlei é maior que o trabalho. É uma válvula de escape, uma terapia, uma volta para a sociedade, uma superação. Aqui, eu vejo os meus amigos, esqueço os problemas da vida e almejo competições.”
Com a ajuda do esporte, Rogério diz ter uma nova família nos treinos, além da que tem em casa. “Quando nos juntamos eu, o Wellington, o Renato, o Deivisson e o Giovani, somos invencíveis. Ninguém ganha da gente.” Não é por menos, os cinco fizeram parte do elenco campeão parapan-americano de 2007.
De volta à cidadania
Wellington Platini, de 25 anos, citado por Rogério, é outro exemplo. Hoje, é jogador do Cruz de Malta, da Seleção Brasileira de voleibol sentado e office boy em uma clínica médica. Um exemplo de garra, determinação, força e, acima de tudo, de superação de adversidades.
Aos 19 anos, o esporte de Wellington era o futebol, mas o destino proporcionou um capítulo triste e decisivo, que não permitiria mais que ele jogasse. “O acidente foi de moto. Eu tava passando num cruzamento, onde o ônibus estava tampando a visibilidade, o cara saiu do cruzamento e me pegou”, descreveu. O choque comprometeu as vias arteriais da perna direita dele, que teve de ser amputada.
O vôlei entrou na vida do jovem três meses após o acidente, por meio de um atleta que já praticava o voleibol sentado e o convidou a conhecer a modalidade, o início de um capítulo de recuperação na vida de Wellington.
“Eu tive que aprender a jogar voleibol e a minha dificuldade, no começo, foi tudo, toque, manchete, como qualquer outro esporte que você está aprendendo. Mas hoje, é o que eu mais gosto de fazer”, afirma o atleta, descrevendo o seu início na modalidade que pratica há cinco anos. Porém, ele aprendeu. E como aprendeu. Após um ano e meio jogando pela equipe Cruz de Malta, de São Paulo, foi convocado para a seleção brasileira júnior e hoje em dia é integrante da seleção principal do Brasil.
Graças ao voleibol, Wellington conhece mais de vinte países, disputou as paraolimpíadas de Pequim, em 2008 e foi campeão parapan-americano no Brasil, em 2007, derrotando os Estados Unidos na final, título que ele considera o momento inesquecível e mais marcante de sua carreira no esporte, pelo menos até agora.
“O esporte me trouxe de volta a cidadania. Mudou a minha vida completamente, a amizade, o comportamento, me fez dar mais valor à vida, aos amigos e à família. O esporte só proporciona coisas boas”, completou Wellington.
O esporte ainda não é profissional
São seis jogadores de cada lado, com rotação de posições a cada ponto conquistado. O jogo é em formato “melhor de cinco sets” e o princípio fundamental é muito simples: não deixar a bola cair na sua quadra, mas fazer com que ela caia na quadra do adversário. Tudo isso, com três toques apenas, de jogadores diferentes.
Com apenas algumas regras diferentes, como poder bloquear o saque, e altura da rede e tamanho da quadra menores, temos uma “nova modalidade”: o voleibol paraolímpico, ou vôlei sentado. A equipe masculina do Brasil foi campeã parapan-americana no Rio de Janeiro, em 2007, vencendo, de virada, os Estados Unidos na final.
No entanto, o esporte encontra dificuldades que a modalidade tradicional não enfrenta. As menores quantias de investimento, dificuldades no transporte dos atletas e a conciliação da prática do esporte com o trabalho de forma paralela são os fatores que, segundo Fernando Guimarães, técnico da equipe Cruz de Malta, de São Paulo, e irmão de José Roberto Guimarães, técnico da seleção brasileira feminina de vôlei, impedem o crescimento do esporte no Brasil.
“A coisa não tá profissional ainda”, diz Fernando, quando o assunto são as condições que regem a forma de organização das competições de voleibol sentado no País. As dificuldades apontadas por Guimarães fazem com que as competições sejam divididas em etapas, com os times chegando a realizar três jogos no mesmo dia. “A gente tem que fazer por etapas. Então, num sábado você faz dois, três jogos, pra poder otimizar o tempo, porque custa e as pessoas trabalham”, explica o treinador.
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