terça-feira, 23 de novembro de 2010

Com a nobreza de um Sir

nota: foi extremamente difícil escrever esse texto, já que ainda não inventaram alguma palavra que possa descrever com precisão o que aconteceu no Morumbi no dia 22/11.

No topo do estádio do Morumbi, na última fileira da arquibancada laranja, a vista do público era perfeita, enxergava-se tudo e todos. Do palco, nem tanto, mas não menos sensacional e impressionante. Foi mais do que suficiente para enxergar aquele tiozinho de suspensórios de 68 anos, e tudo o que ele foi capaz de fazer.

“Roll up for the Mystery Tour!” Foi assim que Sir Paul McCartney começou a brincadeira em sua segunda noite de show em São Paulo (diferentemente da noite anterior e de Porto Alegre), para mais de 60 mil fãs, de todas as idades, como bem visto em inúmeras reportagens da TV nos últimos dias.

A Rede Globo, inclusive, transmitiu a primeira noite no domingo, pós-Fantástico, não sei com qual foco, ou mesmo se passaram o show na íntegra. Claro, não foi a mesma coisa do que assistir ao vivo, como testemunha ocular. Desta maneira, talvez seja pertinente dizer: foi um dos maiores dos shows de todos os tempos.

Paul tocou baixo, guitarra, violão, piano, bandolim e ukulele, em um setlist de 37 músicas, com clássicos de sua carreira solo, dos Wings e, obviamente, dos Beatles. Um espetáculo, no sentido mais literal da palavra, com quase três horas de duração.

O “tiozinho de suspensórios” simplesmente não parava no palco. Cantou, pulou e, acompanhado de uma “discreta“ cola, conversou, e muito, com os fãs, em um português bem claro, para o delírio de todos.

Melhor do que falar de cada música ou dizer o setlist completo é citar (até porque é impossível descrever) alguns grandes momentos, como o estádio tremendo em “All My Loving” ou a dança do baterista em “Dance Tonight”. Vale lembrar, também, os “enormes” momentos, como a dança de 60 mil pessoas em “Obladi Oblada” e as homenagens a John Lennon e George Harrison, com “Here Today” e “Something”, respectivamente.

Todos já sabiam o que vinha para o final, só não sabiam a ordem – com exceção daqueles que já haviam assistido à primeira noite na TV Globo.

Foram executadas, nessa ordem, “A Day in the Life/Give Peace A Chance”, “Let It Be”, “Live And Let Die” – um espetáculo à parte: se Paul subisse no palco, tocasse essa música e fosse embora, seria suficiente para deixar várias pessoas felizes por meses – e “Hey Jude”, uma das mais aguardadas da noite, com o famoso coro do final cantado não apenas em uníssono, mas por homens e mulheres em separado, como regeu Sir Paul McCartney.

Paul sai do palco e volta, carregando uma bandeira brasileira, para o primeiro bis, com Day Tripper, Lady Madonna e Get Back. Muitos já deixavam o Morumbi, pensando que o espetáculo havia terminado e não viram o segundo bis, com Yesterday, Helter Skelter (nota do autor: PQP!) e Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band/The End.

Os preços foram abusivos e a organização ao redor do estádio não foi a melhor, mas o que se viu no palco, compensou, pelo menos para cada pessoa presente no Morumbi nas noites dos dia 21 e 22 de novembro de 2010. Todos batiam palmas incessantemente, por aproximadamente três horas e Paul McCartney provou porque é mais do que “apenas” um dos maiores artistas de todo os tempos, apenas agradecendo, ao final de cada música como se fosse a última, com a nobreza de um Sir.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Vencendo de virada, na vida e na quadra

por Luiz Henrique Ferreira e Gabriel Nunes, como parte da reportagem "Volta por Cima", para a Universidade Anhembi Morumbi


Aos 17 anos, Rogério Camargo foi vítima de um acidente de moto e teve a perna esquerda amputada. Hoje, ele tem 34 anos, trabalha em uma loja de automóveis, é casado, tem uma filha e um filho e ainda luta contra o preconceito, desde o acidente.

O que ninguém sabe quando vai à loja onde Rogério trabalha é que ele já disputou duas finais parapan-americanas de voleibol sentado e foi campeão uma vez.

Com a ajuda do esporte, Rogério se colocou de volta na sociedade, mas ainda tem que trabalhar para se sustentar. Diferentemente dos jogadores seleção da masculina eneacampeã mundial, que são bancados pelos clubes onde atuam, os paraatletas não recebem para jogar, treinam e jogam por prazer, mas gostariam de ter mais visibilidade, a ponto de viver pelo esporte.

Rogério joga pelo Cruz de Malta, pelo qual já foi tricampeão brasileiro, tetracampeão paulista e bicampeão do torneio Sérgio Del Grande – organizado pelo Comitê Paraolímpico Brasileiro. Para ele, “o vôlei é maior que o trabalho. É uma válvula de escape, uma terapia, uma volta para a sociedade, uma superação. Aqui, eu vejo os meus amigos, esqueço os problemas da vida e almejo competições.”

Com a ajuda do esporte, Rogério diz ter uma nova família nos treinos, além da que tem em casa. “Quando nos juntamos eu, o Wellington, o Renato, o Deivisson e o Giovani, somos invencíveis. Ninguém ganha da gente.” Não é por menos, os cinco fizeram parte do elenco campeão parapan-americano de 2007.

De volta à cidadania

Wellington Platini, de 25 anos, citado por Rogério, é outro exemplo. Hoje, é jogador do Cruz de Malta, da Seleção Brasileira de voleibol sentado e office boy em uma clínica médica. Um exemplo de garra, determinação, força e, acima de tudo, de superação de adversidades.

Aos 19 anos, o esporte de Wellington era o futebol, mas o destino proporcionou um capítulo triste e decisivo, que não permitiria mais que ele jogasse. “O acidente foi de moto. Eu tava passando num cruzamento, onde o ônibus estava tampando a visibilidade, o cara saiu do cruzamento e me pegou”, descreveu. O choque comprometeu as vias arteriais da perna direita dele, que teve de ser amputada.

O vôlei entrou na vida do jovem três meses após o acidente, por meio de um atleta que já praticava o voleibol sentado e o convidou a conhecer a modalidade, o início de um capítulo de recuperação na vida de Wellington.

“Eu tive que aprender a jogar voleibol e a minha dificuldade, no começo, foi tudo, toque, manchete, como qualquer outro esporte que você está aprendendo. Mas hoje, é o que eu mais gosto de fazer”, afirma o atleta, descrevendo o seu início na modalidade que pratica há cinco anos. Porém, ele aprendeu. E como aprendeu. Após um ano e meio jogando pela equipe Cruz de Malta, de São Paulo, foi convocado para a seleção brasileira júnior e hoje em dia é integrante da seleção principal do Brasil.

Graças ao voleibol, Wellington conhece mais de vinte países, disputou as paraolimpíadas de Pequim, em 2008 e foi campeão parapan-americano no Brasil, em 2007, derrotando os Estados Unidos na final, título que ele considera o momento inesquecível e mais marcante de sua carreira no esporte, pelo menos até agora.


“O esporte me trouxe de volta a cidadania. Mudou a minha vida completamente, a amizade, o comportamento, me fez dar mais valor à vida, aos amigos e à família. O esporte só proporciona coisas boas”, completou Wellington.

O esporte ainda não é profissional

São seis jogadores de cada lado, com rotação de posições a cada ponto conquistado. O jogo é em formato “melhor de cinco sets” e o princípio fundamental é muito simples: não deixar a bola cair na sua quadra, mas fazer com que ela caia na quadra do adversário. Tudo isso, com três toques apenas, de jogadores diferentes.

Com apenas algumas regras diferentes, como poder bloquear o saque, e altura da rede e tamanho da quadra menores, temos uma “nova modalidade”: o voleibol paraolímpico, ou vôlei sentado. A equipe masculina do Brasil foi campeã parapan-americana no Rio de Janeiro, em 2007, vencendo, de virada, os Estados Unidos na final.

No entanto, o esporte encontra dificuldades que a modalidade tradicional não enfrenta. As menores quantias de investimento, dificuldades no transporte dos atletas e a conciliação da prática do esporte com o trabalho de forma paralela são os fatores que, segundo Fernando Guimarães, técnico da equipe Cruz de Malta, de São Paulo, e irmão de José Roberto Guimarães, técnico da seleção brasileira feminina de vôlei, impedem o crescimento do esporte no Brasil.

“A coisa não tá profissional ainda”, diz Fernando, quando o assunto são as condições que regem a forma de organização das competições de voleibol sentado no País. As dificuldades apontadas por Guimarães fazem com que as competições sejam divididas em etapas, com os times chegando a realizar três jogos no mesmo dia. “A gente tem que fazer por etapas. Então, num sábado você faz dois, três jogos, pra poder otimizar o tempo, porque custa e as pessoas trabalham”, explica o treinador.